sábado, 7 de janeiro de 2012

Lançamento do livro-reportagem “A Privataria Tucana” em Curitiba. Quarta, 19/01

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A Opus Dei e a estratégia de poder da extrema direita fundamentalista

A Ópus Dei na América Latina

por Henrique Júdice Magalhães

Analisando a estrutura de classes dos países latino-americanos, Darcy
Ribeiro identificava como segmento hegemónico dentro das classes
dominantes o corpo de gerência das transnacionais. Ponta de lança do
imperialismo, é ele quem dita ordens e impõe ideologias às demais
fracções e, em muitos casos, organiza-as politicamente. A
desnacionalização das economias latino-americanas na década de 90
agravou este quadro. A alteração de mais relevo no perfil da classe
dominante verificada no bojo deste processo é o crescimento da
influência da Opus Dei. Sustentada pelo capital espanhol, a
organização controla jornais, universidades, tribunais e entidades de
classe, sendo hoje peça chave para se compreender o processo político
no continente, inclusive no Brasil, onde quer eleger Geraldo Alckmin
presidente da República.

Procissão Católica na Espanha, berço da Opus Dei.

Mas o que é afinal, a Opus Dei (em latim, Obra de Deus)?
Em seu campo original de actuação, é a vanguarda das tendências mais
conservadoras da Igreja Católica. "Este concílio, minhas filhas, é o
concílio do diabo" teria dito seu fundador, Josemaria Escrivá de
Balaguer, sobre o Vaticano II, no relato do jornalista argentino
Emilio J. Corbiere no seu livro "Opus Dei. El totalitarismo católico".

Fundada na Espanha em 1928, a organização foi reconhecida pelo
Vaticano em 1947. Em 1982, foi declarada uma prelatura pessoal, o que,
sob o Direito canónico, significa que só presta contas ao papa e que
seus membros não se submetem à jurisdição dos bispos. "A relação entre
Karol Wojtyla e a Opus Dei" conta o teólogo espanhol Juan José Tamayo
Acosta "atinge seu êxito nos anos 80-90, com a irresistível ascensão
da Obra à cúpula do Vaticano, a partir de onde interveio altivamente,
primeiro no esboço e depois na colocação em prática do processo de
restauração da Igreja católica sob o protagonismo do papa e a
orientação teológica do cardeal alemão Ratzinger."

Fontes ligadas à Igreja Católica atribuem o poder da Obra à quitação
da dívida do Banco Ambrosiano, fraudulentamente falido em 1982.

Obscurantismo e misoginia são traços que marcam a organização.
Exemplos podem ser encontrados nas denúncias de ex-adeptos como Jean
Lauand, professor da Faculdade de Educação da Universidade de São
Paulo – Universidade de São Paulo (USP), que recentemente escreveu
junto com mais dois ex-membros, o juiz Márcio Fernandes e o médico
Dário Fortes Ferreira, o livro "Opus Dei – os bastidores". Em
entrevista ao programa Biblioteca Sonora, da Rádio USP, Jean Lauand
conta que a Obra tem um "Index" de livros proibidos que abrange
praticamente toda a filosofia ocidental desde Descartes. Noutra
entrevista, à revista Época, Jean Lauand denuncia as estratégias de
fanatização dos chamados numerários, leigos celibatários que vivem em
casas da organização: "Os homens podem dormir em colchões normais, as
mulheres têm de dormir em tábuas. São proibidas de segurar crianças no
colo e de ir a casamentos". É obrigatório o uso de cinturões com
pontas de ferro fortemente atados à coxa, como prática de mortificação
que visa refrear o desejo. Mas os danos infligidos pelo fanatismo não
se limitam ao corpo.

No site que mantém com outros dissidentes (http://www.opuslivre.org/),
Jean Lauand revela que a Obra conta com médicos especialmente
encarregados de receitar psicotrópicos a numerários em crise nervosa.

A captação de numerários dá-se entre estudantes de universidades e
escolas secundárias de elite. Centros de estudos e obras de caridade
servem de fachada. A Opus Dei tem forte presença na USP, em especial
na Faculdade de Direito, onde parte do corpo docente é composta por
membros e simpatizantes, como o numerário Inácio Poveda e o director
Eduardo Marchi. Outro expoente da organização na USP é Luiz Eugênio
Garcez Leite, professor da Faculdade de Medicina e autor de panfletos
contra a educação mista. A Obra actua também na Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade de Campinas (Unicamp) e
Universidade de Brasília (UnB).

Fazendo a América

Mas a Opus Dei é mais que um tema de saúde pública. Ela tem, desde a
origem, uma clara dimensão política. Durante a ditadura de Franco,
praticamente fundiu-se ao Estado espanhol, ao qual forneceu ministros
e dirigentes de empresas e órgãos governamentais.No fim da década de
40, inicia sua expansão rumo à América Latina. Não foi difícil
conquistar adeptos entre oligarquias como as da Cidade do México,
Buenos Aires e Lima, que sempre buscaram diferenciar-se de seus povos
apegando-se a um conceito conservador de pretensa hispanidade. Um dos
elementos definidores desse conceito é exactamente o integralismo
católico.

Alberto Moncada, outro dissidente, conta em seu livro "La evolución
del Opus Dei": "os jesuítas decidiram que seu papel na América Latina
não deveria continuar sendo a educação dos filhos da burguesia, e
então apareceu para a Opus Dei a ocasião de substituí-los – ocasião
que não hesitou em aproveitar".

No Brasil, a organização deitou raízes em São Paulo no começo da
década de 50, concentrando sua actuação no meio jurídico. O promotor
aposentado e ex-deputado federal Hélio Bicudo conta que por duas vezes
juízes tentaram cooptá-lo. Seu expoente de maior destaque foi José
Geraldo Rodrigues Alckmin, nomeado ministro do Supremo Tribunal
Federal (STF) por Médici em 1972 e tio do actual governador de São
Paulo. Acontece que nos anos 70, o poder da Opus Dei era embrionário.
Tinha quadros em posições importantes, mas sem actuação coordenada.
Além disso, dividia com a Tradição, Família e Propriedade (T.F.P.) as
simpatias dos católicos de extrema-direita.

Era natural, da mesma forma, que, alguns quadros dos regimes nascidos
dos golpes de Estado de 1966 e 1976, na Argentina, e 1973, no Uruguai,
fossem também quadros da Opus Dei. Mas segundo se lê no livro de
Emilio J. Corbiere , sua actuação era ainda dispersa, o que não os
impediu de controlar a Educação na Argentina durante o período Onganí
(1966-70).

Já no Chile, a Opus Dei foi para o pinochetismo o que havia sido para
o franquismo na Espanha. O principal ideólogo do regime, Jaime Guzmá,
era membro activo da organização, assim como centenas de quadros civis
e militares.

No México, a Obra conseguiu fazer Miguel de la Madrid presidente da
República em 1982, iniciando a reversão da rígida separação entre
Estado e Igreja imposta por Benito Juárez entre 1857 e 1861.

Internacional reaccionária

A Opus Dei não criou o reacionarismo católico, antes, teve nele sua
base de cultura. Mas sistematizou-o doutrinariamente e organizou
politicamente seus adeptos de uma forma quase militar. Hoje, funciona
como uma espécie de Internacional reaccionária, congregando,
coordenadamente, adeptos em todo o mundo.

Concorrem para isto, nos anos 90, o ápice do poder da Obra no Vaticano
e a invasão da América Latina por transnacionais espanholas.

A Argentina entregou suas estatais de telefonia, petróleo, aviação e
energia á Telefónica, Repsol, Iberia e Endesa, respectivamente. A
Telefónica controla o sector também no Peru e em São Paulo. A Iberia
já havia engolido a LAN, do Chile, onde a geração de energia também é
controlada pela Endesa. Bancos espanhóis também chegaram ao continente
neste processo.

No Brasil, o Santander comprou o Banespa e o Meridional, enquanto que
o BBVA recebeu os activos do Excel através do Proer, no governo de
Fernando Henrique Cardoso.

"A Opus Dei tem sido para o modelo neoliberal o que foram os
dominicanos e franciscanos para as cruzadas e os jesuítas frente à
Reforma de Lutero" compara José Steinsleger, colunista do diário
mexicano "La Jornada".

A organização actua também no monopólio da imprensa. Controla o jornal
"El Observador", de Montevidéu, e exerce influência sobre órgãos
tradicionais da oligarquia como "El Mercurio", no Chile, "La Nación",
na Argentina e "O Estado de São Paulo", no Brasil. O elo com a
imprensa é o curso de pós-graduação em jornalismo da Universidade de
Navarra em São Paulo, coordenado por Carlos Alberto di Franco,
numerário e comentarista do "Estadão" e da Rádio Eldorado.

O segundo homem da Opus Dei na imprensa brasileira é o também
numerário Guilherme Doring Cunha Pereira, herdeiro do principal grupo
de comunicação do Paraná ("Gazeta do Povo"). Os jornalistas Alberto
Dines e Mário Augusto Jakobskind denunciam que a organização controla
também a Sociedade Interamericana de Imprensa – SIP (na sigla em
espanhol).

Sedeada na Espanha, a Universidade de Navarra é a jóia da coroa da
Opus Dei no negócio do ensino. Sua receita anual é de 240 milhões de
euros. Além disso, a Obra controla as universidades Austral
(Argentina), Montevideo (Uruguai), de Piura (Peru), de Los Andes
(Chile), Pan Americana (México) e Católica André Bello (Venezuela).

Dentro da igreja católica, a Opus Dei emplacou, na última década,
vários bispos e Cardeais na América Latina. O mais notável é Juan Luís
Cipriani, de Lima, no Peru, amigo íntimo da ditadura de Alberto
Fujimori. Em seu estudo "El totalitarismo católico em el Peru", o
jornalista Herbert Mujica denuncia que quando o Movimento
Revolucionário Tupac Amaru tomou a embaixada do Japão, em 1997, Juan
Luís Cipriani, valendo-se da condição de mediador do conflito,
instalou equipamentos de escuta que possibilitaram à polícia invadir a
casa e matar os ocupantes.

Na Venezuela, a Obra teve papel essencial no fracassado golpe de 2002
contra Hugo Chávez. Um dos articuladores da tentativa foi José
Rodríguez Iturbe, nomeado ministro das Relações Exteriores. Também
participou da articulação à embaixada da Espanha, governada na época
pelo neo-franquista Partido Popular (PP).

Após os reveses na Venezuela, as esperanças da Opus Dei voltaram-se
para Joaquím Laví, no Chile, e Geraldo Alckmin, no Brasil, hoje seus
quadros políticos de maior destaque. Joaquím Laví foi derrotado nas
últimas eleições presidenciais chilenas em Dezembro. Resta o Brasil,
onde a Obra tenta fazer de Geraldo Alckmin presidente e formar um eixo
geopolítico com os governos Álvaro Uribe (Colombia) e Vicente Fox
(México), aos quais está intimamente associada.

Entranhas mafiosas

Além das dimensões religiosa e política, a Opus Dei tem uma terceira
face: a de sociedade secreta de cunho mafioso. Em seus estatutos
secretos, redigidos em 1950 e publicados em 1986 pelo jornal italiano
"L´Expresso", a Obra determina que "os membros numerários e
supernumerários saibam que devem observar sempre um prudente silêncio
sobre os nomes dos outros associados e que não deverão revelar nunca a
ninguém que eles próprios pertencem à Opus Dei."

Inimiga jurada da Maçonaria, ela copia sua estrutura fechada o que
frequentemente serve para encobrir actos criminosos.

Entre os católicos, a Opus Dei é conhecida como "Santa Máfia", Emilio
J. Corbiere lembra os casos de fraude e remessa ilegal de divisas nas
empresas espanholas Matesa e Rumasa, em 1969, onde parte dos activos
desviados financiaram a Universidade de Navarra. Bancos espanhóis são
suspeitos de lavagem de dinheiro do narcotráfico e da máfia russa. A
Opus Dei também esteve envolvida nos episódios de falência fraudulenta
dos bancos Comercial (Uruguai, pertencente à família Peirano, dona de
"El Observador") e de Crédito Provincial (Argentina).

Na Argentina os responsáveis pelas desnacionalizações da petrolífera
YPF e das Aerolineas Argentinas, compradas por empresas espanholas, em
dois dos maiores escândalos de corrupção da história do país, tiveram
sua impunidade assegurada pela Suprema Corte, onde pontificava António
Boggiano, membro da Opus Dei.

No Brasil, as pretensões de controlo sobre o Judiciário esbarram no
poder dos Maçons.

A Opus Dei controla, porém, o Tribunal de Justiça de São Paulo através
da manipulação de promoções. Segundo fontes do meio jurídico paulista,
de 25 a 40% dos juízes de primeira instância no estado pertencem à
organização – proporção que se repete entre os promotores, no
tribunal, a proporção sobe para 50 a 75%.

Recentemente, o tribunal, em julgamento secreto, decidiu pelo
arquivamento de denúncia contra Saulo Castro Abreu Filho, braço
direito de Geraldo Alckmin, acusado de organizar grupos de extermínio
desde a secretaria de Segurança, e contra dois juízes acusados de
participação na montagem desses grupos.

A fusão dos tribunais de Justiça e de Alçada, determinada pela Emenda
Constitucional n.º 45, foi uma medida da equipe do ministro da
Justiça, Mácio Thomaz Bastos, para reduzir o poder da Obra no
judiciário paulista, cuja orientação excessivamente conservadora,
principalmente em questões criminais e de família, é motivo de alarme
entre profissionais da área jurídica.

http://geosapiens.blogspot.com/2006/04/pus-dei-na-amrica-latina.html


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