segunda-feira, 1 de abril de 2024

“Coronel Redl”, de István Szabó, 1985

 


“Coronel Redl”, de István Szabó, 1985 – Império Austro-húngaro, final do século XIX, início do século XX. Um menino de origem humilde, Alfred Redl, é enviado a uma escola militar, onde fica amigo de Kristof Kubinyi, de origem nobre. Sua profunda lealdade ao Imperador Franz Joseph faz com que rapidamente suba na carreira militar, sendo alçado a coronel e, posteriormente, indicado para atuar como Chefe da Contraespionagem do Império, o que o leva a ter de lidar com toda sorte de conspirações e conchavos.

Ainda que Alfred Redl tenha sido uma eminente personalidade real do exército do Império Austro-húngaro nos anos que antecederam a Primeira Guerra Mundial, o filme é levemente inspirado em uma peça de John Osborne, “A Patriot for Me”, e revela, em seus minutos iniciais, completa infidelidade aos fatos, deixando claro tratar-se de uma obra de ficção inspirada na figura real do militar. Assim, ainda que questões-chaves da vida de tal personalidade sejam mantidas, há uma clara romantização da história, com inserção de acontecimentos puramente ficcionais. A narrativa acompanha a trajetória do personagem desde sua infância humilde na Galiza até alcançar o mais alto posto dentro do Setor de Contraespionagem da Diretoria da Inteligência Militar do Exército Austro-húngaro, possibilitando um breve panorama dos conflitos, ardis e conspirações envolvendo política e exército no seio do Império Austro-húngaro. A obra é um fascinante exercício acerca da lealdade versus traição que se desenrola não apenas em âmbito “macro”, na política, exército e governo, mas, também, no universo pessoal do personagem, envolvendo sua amizade com a família Kubinyi, que inclui um relacionamento afetivo-sexual com os irmãos Kristof e Katalin. O diretor é bastante feliz na forma como espelha essa dicotomia da lealdade/deslealdade nos diferentes contextos, inclusive mostrando os questionamentos de Redl quanto sua própria conduta quando provocado a delatar um colega ou um subalterno. Szabó também consegue retratar, com esmero, os recônditos do Exército Austro-húngaro e sua promíscua relação com a nobreza – Kristof, mesmo sendo um oficial medíocre, insubordinado, pouco leal ao Imperador e completamente devasso, rapidamente galga cargos políticos e patentes militares graças à sua origem nobre e seus contatos sociais. A narrativa é linear, com grandes lapsos temporais, e ritmo moderado. A atmosfera é de leve tensão, a qual cresce à medida em que Redl sobe de posto e ganha responsabilidades, entrando na mira do Arquiduque Franz Ferdinand, herdeiro do trono e conspirador de primeiríssima linha – o que leva Redl a, gradativamente, “flexibilizar” sua ética e lealdade ao Império. O filme é grandioso quanto ao seu desenho de produção de época, retratando belamente os primórdios do século XX, de suas festas e bailes aos exercícios militares do exército. A fotografia colorida aproveita muito bem a saturação de cores e os planos bem abertos, muito embora não crie nenhuma linguagem cinematográfica inovadora e permaneça no terreno mais convencional. Quanto às interpretações, Klaus Maria Brandauer despeja todo seu talento no personagem Redl e consegue exprimir as contradições e angústias do protagonista com notável cuidado e muita “paixão”; Jan Niklas interpreta Kristof sem grande brilho em seu trabalho; Gudrun Langrebe interpreta Katalin, Armin Mueller-Stahl, o Arquiduque Franz Ferdinand e Hans Christian Blech, o General Von Roden – todos competentes, mas ninguém excepcional. Destaque para a última cena de Klaus Maria Brandauer – interpretação sensacional! – e para a ironia da última cena de Franz Ferdinand. O filme foi agraciado com o Prêmio BAFTA (1986) na categoria Melhor Filme Estrangeiro, e com o Prêmio do Juri no Festival de Cannes (1985); foi ainda indicado ao Oscar (1986) de Melhor Filme Estrangeiro, perdendo para o argentino “A História Oficial” (1985). É um filme bem interessante, mas que mexe mais com o nosso intelecto do que com as nossas emoções (não é um filme sensorial). Em todo caso, acho que vale muito à pena.

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