sexta-feira, 26 de agosto de 2011

O Ocidente Expansionista e a Líbia

A questão Líbia tem que ser analizada pelo enfoque do grande jogo de forças internacionais, e não apenas pela figura de Kadafi.

 A ação EUA-EU-OTAN não foi determinada pela qualidades ou defeitos do Kadafi, por ele ser ditador ou não. A tradição histórica do ocidente está mais ligada a instalar ditaduras em países da periferia que derrubá-las.

Vários informes dão conta da preparação prévia da revolta armada contra o Governo Líbio meses antes das Revoluções Árabes, principalmente por ação dos EUA + França + Inglaterra e Qatar.

Este movimento deve ser entendido dentro de um contexto, onde a Líbia possui o maior IDH da África, 90% da renda do petróleo é absorvida pelo país, educação e saúde são públicas e gratuitas, e o governo investe em infraestrutura, como o aqueduto de 6000 km e o sistema financeiro islâmico com empréstimo sem cobrança de juros. Outra característica do país é o tribalismo, onde o poder é distribuído entre as diversas tribos do país com predominancia das tribos de Trípoli.

Ademais o Governo Líbio estava montando um banco de desenvolvimento da África com uma nova moeda vinculada ao ouro, o Dinar-Ouro. Só esta ação já deslocaria a estrutura de poder na África do Ocidente em crise para a Líbia.

Mas tudo isto talvez ainda não seria suficiente para levar a uma comunhão tão grande de países contra a Líbia, isto não aconteceu nem contra o Iraque de Sadan Hussein.

Outro fato relevante foi a questão dos fundos soberanos Líbios, uma parte deles foi aplicada nos grandes bancos dos EUA e Europa, houve o caso de uma aplicação que somou 2 Bilhões de dólares em gerou um prejuízo quase total do capital, os bancos devolveram 200 milhões. O governo líbio ameaçou processar os bancos, o que comprometeria a imagem já desgastada de vários grandes bancos ocidentais. A oligarquia financeira internacional é o único centro de poder que tem capacidade de influenciar de forma tão ampla tantos países.

O que se viu foi um enredo preparado, onde no segundo dia da revolta Líbia Bengazi já estava toda a armada até os dentes, ou seja não houve revolta popular, foi um grupo previamente preparado com estratégia definida, que atacou diretamente os quartéis e tomou as armas do exército Líbio. Isto não é revolta espontânea.

Imediatamente vários componentes do Governo Líbio desertaram para a revolta, novamente  ministros não deixariam um Governo para uma aventura de um grupo armado se não houvesse associação prévia, e suporte estrangeiro.

Ao mesmo tempo os governos da Europa, EUA e monarquias do Golfo fizeram algo quase impensável, passaram a dar apoio diplomático, econômico e militar a um grupo que surgiu do nada e que foi para a luta armada contra o governo do país, grupo este que não se sabia a história, suas políticas, ideologias e seus vínculos.  

É impossível entender este movimento sem constatar que a articulação com a revolta armada foi realizada pelos países ocidentais muito antes dela eclodir.  

Basta lembrar o que ocorreu aqui no Brasil, o apoio e suporte para a preparação da luta armada dos golpistas de 1964 iniciou dois anos antes, em 1962, com a autorização do presidente Democrata John Kennedy ao Embaixador Lincon Gordon para iniciar a conspiração de grupos militares e da extrema direita contra o governo eleito Brasileiro. 

A luta Líbia seria facilmente controlada pelo governo e exército Líbios, para impedir isto foi montada a operação militar ocidental, que também demanda meses de preparação para alcançar o volume e eficiência demonstrada. A organização logística, planejamento e alocação de recursos foi iniciada muito antes da  revolta iniciar e da resolução da ONU. 

A operação militar ocidental não foi improvisada após a resolução da ONU que Rússia e China covardemente deixaram de vetar, foi baseada em doutrina testada e sedimentada, que consiste na conquista militar realizada através do macisso apoio aéreo a uma força local de combatentes em terra.

Esta doutrina calcada em apoio aéreo já foi utilizada nas guerras para a dissolução da Ioguslávia,  na Bósnia em apoio aos mussulmanos, em Kosovo em apoio a um grupo mafioso o PPK, e também no Afeganistão em apoio a Aliança do Norte. 

A vantagem tecnológica do norte-ocidental é tão expressiva no setor aéreo militar que sequer perdem um avião, tem enorme precisão, podem agir com impunidade e sem custos humanos.

O ataque militar da OTAN iniciou antes da resolução da ONU, com o abate de aviões da Força Aérea Líbia, com mísseis lançados de aviões a 50km de distância sobre águas internacionais no Mediterrâneo, este mísseis e os aviões da OTAN não podiam ser identificados pelos recursos das Forças Líbias.

Uma passagem interessante do processo é a participação de grupos ligados a Al Quaeda. Na guerra do Iraque os serviços de interligência americanos identificaram que um grande contingente de terroristas suicidas era provenientes da Líbia, e de uma tribo perto de Bengazi. Quando iniciou o ataque a Líbia o próprio comandante das forças dos EUA denunciou a participação destes grupos  nas forças rebeldes, o comandante americano foi substituído de imediato.

Esta associação repete o mesmo padrão realizado na Guerra do Afeganistão contra a União Soviética e da Bósnia na desagregação da Ioguslávia.

Nada de novo no front, vale notar ainda o macisso apoio das grandes corporações de comunicação á política expansionista da OTAN, não houve uma análise ou notícia sobre a Líbia que não estivesse de acordo com a política militar dos EUA-Europa.

O envolvimento ideológico foi muito bem elaborado, mesmo os grupos de esquerda preferiram abster-se e deixar o barco correr, alguns inclusive saldando a revolta armada montada pelas potências ocidentais como um movimento revolucionário das massas árabes.

Mas agora o que vamos ver é o aprofundamento da solução neoliberal ocidental na Líbia, via manu militari, companias ocidentais privatizarão todas as companias e recursos líbios, bancos vão cobrar juros, o aqueduto gigante será privatizado e os líbios vão pagar a água por metro cúbico, a renda do petróleo sera assimilada pelas companias americanas e européias, escolas, universidades e hospitais antes públicos e gratuitos agora serão privatizados e os líbios irão pagar por eles.

Um novo reino de felicidade será instituído, aliás com a provável volta da monarquia absolutista que o Kadafi havia derrubado.



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segunda-feira, 22 de agosto de 2011

A droga de maior impacto individual e social, sua liberalidade e seu controle


Do Terra Magazine

Rizzatto Nunes
De São Paulo


Um assunto que foi bastante noticiado nas duas últimas semanas foi o do projeto de lei do governo do Estado de São Paulo, que visa punir com multas de até R$87.000,00 estabelecimentos que vendam, ofereçam, entreguem ou permitam o consumo, em suas dependências, de bebida com qualquer teor alcóolico para menores de 18 anos em todo o Estado. A multa dobrará em caso de reincidência e pode levar à perda da inscrição estadual do comerciante.

Antes de prosseguir, lembro que já é proibido vender, oferecer ou entregar bebida alcoólica a menores de 18 anos. A questão é outra: ela está ligada as medidas que tentam coibir o uso pernicioso desse tipo de bebida não só por menores como por adultos, mas que funcionam apenas como paliativo. Pergunto: não haveria outros modos mais eficazes de se combater esse vício? Pensemos no assunto.

Ninguém dúvida do mal que as bebidas alcoólicas fazem e, particularmente, nós consumeristas, temos combatido fortemente os anúncios publicitários que incentivam o consumo desse tipo de droga. Os malefícios causados, especialmente aos jovens, são enormes.

É evidente que não se pretende a proibição de fabricação das bebidas que contém álcool, mas está mais do que na hora de se utilizar entre nós os métodos modernos para restringir a aquisição de bebidas e que tem funcionado muito bem. É preciso, por exemplo, proibir a publicidade e limitar os pontos de venda. Em Estados americanos como Utah, os consumidores da Capital, Salt Lake City, somente podem comprar bebidas alcoólicas em lojas especializadas, nas quais só podem entrar maiores de 18 anos. Nos Supermercados, por exemplo, só se vende cerveja sem álcool. O mesmo se dá no Canadá. Em Vancouver, cidade que tem uma das melhores qualidades de vida do mundo, só é possível comprar bebidas nas "liquor stores" e, claro, também, lá só entram maiores de idade.

Pergunta-se: isso impede que as pessoas bebam? Claro que não, pois ainda se pode beber em casa depois de adquirir a bebida na loja especializada ou se pode beber num restaurante, numa boate etc, mas é proibido portar garrafas ou latas de bebidas alcoólicas abertas nas ruas ou nos automóveis.

A venda ampla e aberta feita por supermercados, mercearias, padarias e congêneres é um facilitador excessivo e implica um estímulo à compra e à ingestão. E, ao contrário, a venda circunscrita em locais específicos, especialmente autorizados e fiscalizados, dificulta em muito não só a compra como também a consequente ingestão de bebidas alcoólicas. Anoto que nesses locais o consumidor não compra por impulso. A aquisição da bebida alcoólica - qualquer que seja o tipo: vinhos, cervejas, destilados etc - exige do consumidor uma tomada de atitude, uma decisão de sair de casa para comprá-la. Ele tem de decidir antes. Já em supermercados, por exemplo, pode muito bem acontecer do consumidor ir comprar saladas e carnes e sair carregado de vinhos e cervejas. Afora o fato de que nesses estabelecimentos comerciais abertos ao público e encontrados em cada esquina, a possiblidade de que menores acabem adquirindo as bebidas seja enorme e mesmo que se obrigue o caixa a fazer um controle da idade do comprador, ainda assim um amigo maior de idade pode se passar por ele e fazer a compra. Enfim, a facilidade é evidente.

No Brasil, infelizmente, se pode comprar bebidas alcoólicas em todo e qualquer lugar abertamente e até via delivery. A leviandade por aqui é tamanha que em festas de adolescentes há pais que servem cervejas e outras bebidas mais fortes à vontade. O mesmo ocorre às vezes em buffets e clubes. E, no que respeita ao comerciante, este, como se sabe, quer vender. Se é permitido, ele faz. Veja-se o que acontece em volta das faculdades brasileiras. Meu amigo Walter Ego diz: "Pode-se definir um prédio de escola superior como um local feito para desenvolvimento de altos estudos, cercado de bares por todos os lados". E anoto que até mesmo dentro de algumas escolas a bebida alcóolica é vendida!

Temos, entre nós, a Lei 9294/96 que, com fundamento no parágrafo 4º do art. 220 da Constituição federal, proibiu a veiculação televisiva dos anúncios de produtos fumígenos, tais como cigarros, cigarrilhas, charutos etc. Falta fazer o mesmo com as bebidas alcoólicas.

Ademais, a publicidade de bebidas alcoólicas, de maneira geral, é sofrível e pode ser caracterizada como abusiva, conforme definição legal (art. 37, parágrafo 2º do Código de Defesa do Consumidor), na medida em que se utiliza de maneira bastante chula da imagem da mulher. As propagandas de cerveja são o melhor exemplo disso, aliás, parece mesmo que falta imaginação aos tão criativos publicitários brasileiros nesse setor: há anos eles só conseguem bater nessa mesma tecla surrada (que não deixa de ser vulgar e abusiva).

É certo que ao final de cada anúncio sempre aparece o aviso: "Beba com moderação". Mas, será que resolve? Sem poder me estender no assunto neste curto espaço, devo dizer que os estudos científicos da semiótica moderna demonstram que da maneira como são produzidos os anúncios, o aviso ao final não tem qualquer eficácia. Explico. O anúncio em si se traduz numa comunicação analógica de imagens agradáveis, sempre com gente bonita, sorridente, cantando, feliz e...bebendo, bebendo, bebendo. Ao final, não com imagens mas, com palavras, isto é, numa comunicação digital, surge a frase do aviso.

Acontece que, a comunicação analógica do anúncio é um código quente, forte de comunicação e atinge, em cheio, o público alvo. Ela encanta, seduz a plateia. O aviso em letras é um código frio, fraco. O mesmo público embevecido com o anúncio lê o aviso e não lhe dá a devida importância. Traduzindo: o aviso não funciona. Exatamente como ocorria com os anúncios de cigarro, onde ao final, após cenas de esporte ou luxo, surgia a frase:"O Ministério da Saúde adverte: fumar faz mal à saúde". Também não funcionava e, no caso, soava paradoxal: se o Ministério da Saúde sabe que faz mal, porque não toma providências mais eficazes? E tomou. Quero dizer, as autoridades tomaram. No caso do cigarro não só se proibiu os anúncios em rádio e tevê como se obrigou os fabricantes a mostrarem os danos que o cigarro causa em fotos (linguagem analógica) e não só em palavras.

Pois bem. No caso das bebidas alcoólicas falta muito. Sabe-se que a proibição relativa ao cigarro teve fundo econômico: o governo percebeu que era mais barato combater o vício do fumo que ficar gastando milhões nos hospitais com os fumantes doentes. Em relação à bebida alcoólica, ter-se-ia que fazer o mesmo. Claro que há o lobby dos fabricantes de bebidas a ser enfrentado e também o interesse dos veículos de comunicação, que faturam alto com os anúncios. Mas, se foi feito com o fumo existe a esperança de que possa ser feito também com as drogas alcoólicas.

É preciso, pois, coragem para a tomada de outras medidas como as sugeridas. Quanto ao aumento da restrição aos anúncios publicitários ou sua proibição, basta uma alteração na lei 9294 nesse sentido. Lembro, como dito, que a Constituição Federal assim o determina.

Não vejo também entrave a que se proíba a venda desse tipo de bebida em supermercados, mercearias, padarias e congêneres, limitando as vendas apenas a estabelecimentos autorizados e controlados e nos quais fique proibida a entrada de menores de dezoito anos.

Se um dia chegarmos a isso, teremos certamente um consumo mais consciente e menos nocivo de bebidas alcoólicas.

Rizzatto Nunes é mestre e doutor em Filosofia do Direito e livre-docente em Direito do Consumidor pela PUC/SP. É desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo. Autor de diversos livros, lançou recentemente "Superdicas para comprar bem e defender seus direitos de consumidor" (Editora Saraiva) e o romance "O abismo" (Editora da Praça).



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segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Os juros brasileiros e a transferência de renda para o sistema financeiro


A proporção do PIB brasileiro gasta com pagamento de juros da dívida pública federal vem caindo nos últimos anos, mas ainda é a maior entre as 20 maiores economias do mundo e também supera a de países europeus afetados pela crise da dívida, à exceção da Grécia.

Segundo dados da Economist Intelligence Unit (EIU) sobre 25 países mais a União Europeia, compilados a pedido da BBC Brasil
, o serviço da dívida brasileira consumiu 5,1% do PIB do país no ano passado, proporção inferior apenas aos 5,47% do PIB gastos pelaGrécia - país que na semana passada teve aprovado um segundo pacote bilionário de resgate para garantir o pagamento de suas dívidas.

Outros países europeus afetados pela crise das dívidas têm uma proporção bem menor de gastos com juros. Portugal gastou no ano passado 3,04% de seu PIB com pagamento de juros de sua dívida, a Espanha, gastou 1,6%, a Irlanda, 3,2% e a Itália teve 4,53% de seu PIB consumido com o serviço de sua dívida.

Apesar de ter a segunda maior proporção de gastos com o serviço da dívida, o Brasil é apenas o 13º da lista quando considerada a proporção do endividamento total em relação ao PIB.
Segundo os dados da EIU, a dívida total brasileira correspondia a 59% do PIB do país ao final do ano passado, proporção bastante inferior a países como Japão (199%), Grécia(143%), Itália (119%), Irlanda (95,7%) e Portugal (93%).

"A alta proporção do PIB gasta com juros pode ser vista como um fator de vulnerabilidade da economia brasileira, mas nas atuais condições não são consideradas como um grande problema", avalia Irene Mia, diretora regional para América Latina e Caribe da EIU, braço de pesquisas da revista Economist.
"O Brasil está crescendo solidamente, tem um bom superávit primário e vem recebendo um grande fluxo de divisas por meio de investimentos estrangeiros diretos. Tudo isso ajuda a compensar a vulnerabilidade de pagar juros tão altos", avalia.
Queda

A proporção do PIB brasileiro gasta com o serviço da dívida vem caindo nos últimos anos –depois de chegar a 8,54% em 2003, caiu para 5,1% no ano passado e, segundo as projeções da EIU, deve ficar em 4,9% neste ano e em 4,3% em 2015.

Nesse período, segundo a organização, o total da dívida brasileira deve cair dos atuais 59% do PIB para 53,7% do PIB em 2015.

As projeções
 indicam que em 2015, após a reestruturação de sua dívida, a Grécia terá uma dívida equivalente a 76,1% do PIB e deverá gastar apenas 2,2% de seu PIB com o serviço de sua dívida, após um pico de 7,3% em 2012.

Outros países europeus, porém, devem verificar um grande aumento na proporção do PIB gasto com juros. A Itália deve chegar a 2015 gastando 6,1% de seu PIB com juros, Portugal deve gastar 6% e a Grã-Bretanha, que em 2010 gastou 2,95%, deve chegar a 4,6% em 2015.

O principal fator que eleva a proporção do PIB brasileiro gasta com o serviço da dívida é a alta taxa de juros básicos, já que a maior parte da dívida brasileira atual foi tomada no mercado interno.

A dívida externa, tomada em moeda estrangeira e a juros praticados no mercado de crédito internacional, representa menos de 5% do total da dívida pública brasileira, segundo os dados do Banco Central.
Estados Unidos e Japão

Os dados compilados pela EIU mostram que o peso da dívida brasileira é muito maior para a economia do país do que as dívidas do Japão, país com a maior dívida relativa ao PIB do mundo, e que os Estados Unidos, que têm a maior dívida nominal.

O Japão, cuja dívida total já ultrapassa os 200% de seu PIB, gastou em 2010 apenas 1,43% de seu PIB com o serviço dessa dívida. 
Essa proporção deverá ser ainda menor em 2011, com uma projeção de gasto de 0,8% do PIB com os juros da dívida.
No caso dos Estados Unidos, que se veem envoltos na polêmica discussão sobre o aumento do limite para o endividamento do país, dos atuais US$ 14,3 trilhões, esse valor deverá representar neste ano 68,3% do PIB do país, e os gastos com juros deverão consumir 1,4% da produção anual de riquezas americana.
Re: Clipping do dia
Re: Clipping do dia


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Bancos criam dinheiro, aumentam a base monetária, alimentam inflação e geram instabilidade financeira

Como o sistema financeiro criou a dívida e nos arrastou para onde estamos agora

Ao contrário da crença popular, o dinheiro que circula pelo mundo não é criado pelos governos, mas sim pela banca privada em forma de empréstimos, que são a origem da dívida.
 
Por Marco Antonio Moreno
O colapso económico é iminente. Os países mais industrializados do mundo enfrentam uma grande crise da dívida
O colapso económico é iminente. Os países mais industrializados do mundo enfrentam uma grande crise da dívida

O colapso económico é iminente. Os países mais industrializados do mundo enfrentam uma grande crise da dívida provocada pela crise do crédito do ano 2008, após a crise das hipotecas imobiliárias e a queda do Lehman Brothers. Estas crises originadas por um colapso do crédito costumam ser muito mais prolongadas e profundas que as crises desencadeadas por um surto inflacionário. Grande parte do mundo enfrenta este tsunami da dívida à beira da bancarrota, como acontece com Grécia, Irlanda e Portugal. No entanto, podemos falar de bancarrota quando estes países possuem enormes riquezas em capital humano e recursos produtivos? De acordo com o actual sistema financeiro, sim. E é por isso que os Serviços Públicos estão a ser cortados e os Bens Públicos privatizados.

Ao contrário da crença popular, o dinheiro que circula pelo mundo não é criado pelos governos, mas sim pela banca privada em forma de empréstimos, que são a origem da dívida. Este sistema privado de criação de dinheiro tornou-se tão poderoso nos últimos dois séculos que passou a dominar os governos a nível mundial. No entanto, este sistema contém em si próprio a semente da sua destruição e é o que estamos a experimentar na crise actual: a destruição do sistema financeiro que temos conhecido, dado que não tem nenhum tipo de saída pelas vias convencionais. Dados os seus níveis colossais, trata-se de uma dívida impagável.

Para compreender isto, há que referir que o sistema financeiro tem funcionado sempre como um gigantesco esquema ponzi, onde os novos devedores permitem manter a velocidade do crédito. Se se produz um colapso dos novos devedores, o sistema fica sem a opção de conceder mais crédito e, à medida que esta opção se cristaliza com o tempo, o sistema inteiro entra em colapso e requer injecções de liquidez na esperança de que os fluxos voltem à normalidade. A habituação do adn colectivo à dependência do crédito produziu este retorno à normalidade durante várias décadas. Mas até o adn acusa fadiga e nesta co-dependência ao crédito recorda os sintomas da escravatura: é a escravatura da dívida.

A criação de dinheiro através do sistema de reserva fraccionada

Os bancos centrais são os responsáveis pela oferta monetária primária, ou base monetária, conhecida também como dinheiro de alto poder expansivo. Este dinheiro de alto poder expansivo é o que chega aos bancos privados, que são quem o reproduz pela via do crédito. A reprodução do dinheiro original depende da taxa de encaixe, ou reservas mínimas requeridas, que produz o efeito inverso: quanto menor é a exigência de reservas, maior é a quantidade de dinheiro que a banca privada cria. Isto conhece-se como o multiplicador monetário e a sua fórmula, muito simples, é m=1/r, onde m é o multiplicador monetário e r o nível de reservas exigidas em percentagem.

Deste modo, perante um nível de reservas de 50% (r=0,5 na equação), o multiplicador monetário é 2, como era nas origens da banca inglesa no ano de 1630. Se o nível de reservas é de 20%, o multiplicador monetário é 5 e se as reservas exigidas são de 10%, o multiplicador é 10 (m=1/0,1), o que indica que está a multiplicar-se dez vezes a quantidade de dinheiro real oferecida pelo banco central.

Grande parte da desregulamentação financeira promovida desde os anos 80 consistiu em dar aos bancos a maior das liberdades para o montante das suas reservas. Deste modo, a clássica norma de reservas em torno de 10% ou 20% foi reduzida a níveis de 1%, e mesmo inferiores, como aconteceu com Citigroup, Goldman Sach. JP Morgan e Bank of America, que, nos momentos mais sérios, afirmavam ter uma taxa de encaixe de 0,5%, com o qual o multiplicador (m=1/0,005) permitia criar 200 milhões de dólares com um só milhão em depósito. E no período da bolha, as reservas chegaram a ser inferiores a 0,001%, o que indica que por cada milhão de dólares em depósito real, se criavam 1.000 milhões do nada.

Esta foi a galinha dos ovos de ouro para a banca. Uma galinha que era de todas as formas insustentável e que foi assassinada pela própria cobiça dos banqueiros que se aproximaram do crescimento exponencial do dinheiro até que este entrou em colapso, demonstrando que toda a ficção se asfixia na conjectura e nada é senão o que é. A solução que os bancos centrais ofereciam era muito simples: mal havia um aumento da inflação, elevavam a taxa de juro para assim encarecerem o crédito e bloquearem os potenciais novos empréstimos (cortando, desta forma, potenciais novos empréstimos) e incentivando, a taxas mais altas, o "aforro" seguro dos prestamistas.

Entende-se agora o abismo em que estamos e por que razão governos e bancos centrais correm a tapar esses enormes buracos que o dinheiro falsamente criado deixou? Entende-se por que razão a Fed e o BCE correm a resgatar o lixo dos activos tóxicos criado neste tipo de operações? Se ainda há dúvidas, deixo aqui este vídeo que pode ajudar a compreender parte importante deste fenómeno. Este documento foi realizado em 2006 e contém sérias advertências que não foram ouvidas nem pelos governos nem pelas pessoas. Por algo será.

Artigo publicado em El Blog Salmón, traduzido por Ana Bárbara Pedrosa para esquerda.net

Base Social e Poder: Relações entre Classes Sociais, Disputa de Poder e Objetivos Estratégicos

"A política é o campo de batalha onde diferentes bases sociais se enfrentam e pelo poder de definir a direção da...