A questão Líbia tem que ser analizada pelo enfoque do grande jogo de forças internacionais, e não apenas pela figura de Kadafi.
A ação EUA-EU-OTAN não foi determinada pela qualidades ou defeitos do Kadafi, por ele ser ditador ou não. A tradição histórica do ocidente está mais ligada a instalar ditaduras em países da periferia que derrubá-las.
Vários informes dão conta da preparação prévia da revolta armada contra o Governo Líbio meses antes das Revoluções Árabes, principalmente por ação dos EUA + França + Inglaterra e Qatar.
Este movimento deve ser entendido dentro de um contexto, onde a Líbia possui o maior IDH da África, 90% da renda do petróleo é absorvida pelo país, educação e saúde são públicas e gratuitas, e o governo investe em infraestrutura, como o aqueduto de 6000 km e o sistema financeiro islâmico com empréstimo sem cobrança de juros. Outra característica do país é o tribalismo, onde o poder é distribuído entre as diversas tribos do país com predominancia das tribos de Trípoli.
Ademais o Governo Líbio estava montando um banco de desenvolvimento da África com uma nova moeda vinculada ao ouro, o Dinar-Ouro. Só esta ação já deslocaria a estrutura de poder na África do Ocidente em crise para a Líbia.
Mas tudo isto talvez ainda não seria suficiente para levar a uma comunhão tão grande de países contra a Líbia, isto não aconteceu nem contra o Iraque de Sadan Hussein.
Outro fato relevante foi a questão dos fundos soberanos Líbios, uma parte deles foi aplicada nos grandes bancos dos EUA e Europa, houve o caso de uma aplicação que somou 2 Bilhões de dólares em gerou um prejuízo quase total do capital, os bancos devolveram 200 milhões. O governo líbio ameaçou processar os bancos, o que comprometeria a imagem já desgastada de vários grandes bancos ocidentais. A oligarquia financeira internacional é o único centro de poder que tem capacidade de influenciar de forma tão ampla tantos países.
O que se viu foi um enredo preparado, onde no segundo dia da revolta Líbia Bengazi já estava toda a armada até os dentes, ou seja não houve revolta popular, foi um grupo previamente preparado com estratégia definida, que atacou diretamente os quartéis e tomou as armas do exército Líbio. Isto não é revolta espontânea.
Imediatamente vários componentes do Governo Líbio desertaram para a revolta, novamente ministros não deixariam um Governo para uma aventura de um grupo armado se não houvesse associação prévia, e suporte estrangeiro.
Ao mesmo tempo os governos da Europa, EUA e monarquias do Golfo fizeram algo quase impensável, passaram a dar apoio diplomático, econômico e militar a um grupo que surgiu do nada e que foi para a luta armada contra o governo do país, grupo este que não se sabia a história, suas políticas, ideologias e seus vínculos.
É impossível entender este movimento sem constatar que a articulação com a revolta armada foi realizada pelos países ocidentais muito antes dela eclodir.
Basta lembrar o que ocorreu aqui no Brasil, o apoio e suporte para a preparação da luta armada dos golpistas de 1964 iniciou dois anos antes, em 1962, com a autorização do presidente Democrata John Kennedy ao Embaixador Lincon Gordon para iniciar a conspiração de grupos militares e da extrema direita contra o governo eleito Brasileiro.
A luta Líbia seria facilmente controlada pelo governo e exército Líbios, para impedir isto foi montada a operação militar ocidental, que também demanda meses de preparação para alcançar o volume e eficiência demonstrada. A organização logística, planejamento e alocação de recursos foi iniciada muito antes da revolta iniciar e da resolução da ONU.
A operação militar ocidental não foi improvisada após a resolução da ONU que Rússia e China covardemente deixaram de vetar, foi baseada em doutrina testada e sedimentada, que consiste na conquista militar realizada através do macisso apoio aéreo a uma força local de combatentes em terra.
Esta doutrina calcada em apoio aéreo já foi utilizada nas guerras para a dissolução da Ioguslávia, na Bósnia em apoio aos mussulmanos, em Kosovo em apoio a um grupo mafioso o PPK, e também no Afeganistão em apoio a Aliança do Norte.
A vantagem tecnológica do norte-ocidental é tão expressiva no setor aéreo militar que sequer perdem um avião, tem enorme precisão, podem agir com impunidade e sem custos humanos.
O ataque militar da OTAN iniciou antes da resolução da ONU, com o abate de aviões da Força Aérea Líbia, com mísseis lançados de aviões a 50km de distância sobre águas internacionais no Mediterrâneo, este mísseis e os aviões da OTAN não podiam ser identificados pelos recursos das Forças Líbias.
Uma passagem interessante do processo é a participação de grupos ligados a Al Quaeda. Na guerra do Iraque os serviços de interligência americanos identificaram que um grande contingente de terroristas suicidas era provenientes da Líbia, e de uma tribo perto de Bengazi. Quando iniciou o ataque a Líbia o próprio comandante das forças dos EUA denunciou a participação destes grupos nas forças rebeldes, o comandante americano foi substituído de imediato.
Esta associação repete o mesmo padrão realizado na Guerra do Afeganistão contra a União Soviética e da Bósnia na desagregação da Ioguslávia.
Nada de novo no front, vale notar ainda o macisso apoio das grandes corporações de comunicação á política expansionista da OTAN, não houve uma análise ou notícia sobre a Líbia que não estivesse de acordo com a política militar dos EUA-Europa.
O envolvimento ideológico foi muito bem elaborado, mesmo os grupos de esquerda preferiram abster-se e deixar o barco correr, alguns inclusive saldando a revolta armada montada pelas potências ocidentais como um movimento revolucionário das massas árabes.
Mas agora o que vamos ver é o aprofundamento da solução neoliberal ocidental na Líbia, via manu militari, companias ocidentais privatizarão todas as companias e recursos líbios, bancos vão cobrar juros, o aqueduto gigante será privatizado e os líbios vão pagar a água por metro cúbico, a renda do petróleo sera assimilada pelas companias americanas e européias, escolas, universidades e hospitais antes públicos e gratuitos agora serão privatizados e os líbios irão pagar por eles.
Um novo reino de felicidade será instituído, aliás com a provável volta da monarquia absolutista que o Kadafi havia derrubado.
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