quarta-feira, 20 de abril de 2011

Abordagem da Temática das Drogas pelo Viés Humanista

 

Uma das bases do estado de direito moderno é o respeito à liberdade individual e a vida privada, ou seja, o estado não pode invadir o âmbito das decisões de cunho pessoal, não pode controlar, regrar ou criminalizar a vida privada.
Como aponta Maria Lúcia Karan**," Enquanto não afete concretamente direitos de terceiros, o indivíduo pode ser e fazer o que bem quiser". Trata-se de direito fundamental.
Este princípio jurídico é estabelecido na constituição e nos códigos acessórios, sendo assim inconstitucional a definição criminal do uso pessoal de substâncias psicoativas como o álcool e outros componentes químicos.
Quem quer aqui que o governo do momento vigie e puna seus gostos ou decisões pessoais, num modelo totalitarista de controle da individualidade e de suas vontades? Este é o sentido da lei que define como crime o consumo individual de drogas.
Questão de saúde pública
A saúde pública leva em conta o impacto destrutivo individual, familiar e comunitário do uso continuado de substâncias psicoativas, e isto varia de nível para cada grupo de impacto e do tipo de droga, e em todas as pesquisas o álcool é o campeão de degradação.
A droga mais nefasta para o Brasil e para o mundo é e sempre foi o álcool, hoje temos 18% da população viciada/dependente ao álcool, é ele que mais potencializa e desencadeia o uso de outras drogas e a violência física e assassinatos no país, assim como o principal componente de acidentes e mortes no trânsito, e junto com o cigarro são fortes agentes de degradação da saúde pública.
Precisamos de um programa de saúde pública para todas as drogas, tabaco, álcool, maconha e outras drogas hoje ilícitas, assim como ações específicas para o enorme consumo de medicamentos psicoativos, fruto da empurroterapia médica, e da vasta demanda social de medicamentos com efeito psíquicos.
Políticas públicas de saúde compõem um rol de ações que vão desde a proibição total de propaganda, restrições no comercio e limitações de locais de consumo, assim como com ações de mudança cultural que venha a reduzir as causas sociais e culturais da demanda para a drogadição.
Ou seja, trazer o problema das drogas para o posto de saúde, ou invés de empurrá-lo para a delegacia, onde ele fica pior, maior, mais caro e mais destrutivo.
Todo mundo já compreendeu que proibir a venda de álcool é inútil e que abre as porta para máfias tomarem conta do comércio, no caso de outras drogas a situação é a mesma, o que falta é amadurecer esta compreensão.
O caso do cigarro é outro ponto relevante, o consumo caiu a partir da proibição da propaganda e do fumo em lugares fechados.
A abordagem é iniciar com a correção jurídica abolindo a lei inconstitucional de criminalização da decisão pessoal do uso de agentes químicos psicoativos, passando a uma forte ação de saúde pública para o desestímulo ao consumo e do tratamento de viciados, focados em todos os tipos de drogas, iniciando pelo de maior consumo e impacto na saúde, o álcool, daí cigarro e demais drogas legais e ilegais. E por fim a regulamentação e comércio restritivos de drogas psicoativas, todas elas, álcool, tabaco, maconha, cocaína, medicamentos etc.
No campo contrário, o foco conservador é o de criminalizar o usuário, fazer o comércio ilegal e cooptar a força dos traficantes que sustentam campanhas políticas e acossam as populações em suas áreas de domínio, nestas áreas quem tem acesso e prospera é a extrema direita, ao fim é ela que vive da criminalização do comércio, e de estigmatizar a opção individual. Esta opção penal e moral, multiplica a violência, mas esta agressão acaba direcionada ás camadas mais humildes, é a estratégia de criminalização da pobreza.
Nossa questão não é a maconha do FHC, mas sim questão de princípios: da Liberdade de decidir por si mesmo conforme as opções de cada um, da Igualdade entre cidadãos e o respeito as suas diferenças de gostos e desejos, da Fraternidade para com pessoas vitimadas por alcoolismo e drogadição ou expostas a violência derivada da proibição do comércio.
Ainda segundo a Juíza de direito aposentada Maria Lúcia Karam: "Não são as drogas que causam violência, mas sim a ilegalidade imposta ao mercado"


** BOLETIM DO INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS, ano 14, nº 167, outubro 2006, São Paulo-SP- Maria Lúcia Karam.

Um comentário:

  1. Belo artigo ! Realmente existem muitos outros fatores por trás da dependência química.

    Não existe um único responsável, mas sim um conjunto de valores e contextos que afetam todos os vícios.

    É sempre bom ter textos como estes que levam à reflexão e debate sobre o tema. Parabéns !

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