Num artigo ("Brazil stares down the US on Libya"), publicado no site da Al Jazeera, o professor de História da New York University, Greg Granding, mostra por A + B - C que o governo brasileiro, sob Dilma Rousseff, recebeu amavelmente (como manda o protocolo) a visita do presidente Obama e família, mas manteve os pontos básicos da agenda brasileira em relação aos Estados Unidos, ou seja, defesa dos interesses nacionais sem conflito aberto mas também sem alinhamento com Washington.
Indo adiante, reitera o articulista essa visão ao comentar a posição brasileira no Conselho de Segurança da ONU, não apoiando a ação aérea dos Estados Unidos e outras potências ocidentais na Líbia, no que se alinha com Rússia, China, Alemanha, Argentina, Uruguai e outros países, embora os dois primeiros não tenham usado seu poder de veto.
Enquanto isso, a "distância" da política externa de Dilma/Patriota em relação à de Lula/Amorim segue sendo constantemente sublinhada na nossa mídia oligárquica, em artigos ou editoriais.
A visão de Dilma/Patriota seria pautada por "realismo", "cooperação compatível" (a referência direta é a China, mas entende-se que o alcance da expressão vai mais longe), como em recente editorial do Estadão. Já a visão de Lula/Amorim - incluindo a do ministro Guido Mantega - se pautaria por ser "terceiro mundista", "juvernil", eivada de "ingenuidade".
Há até um comentário lateral muito importante: "Até agora, as autoridades chinesas se mostraram muita mais lúcidas que as brasileiras na concepção e na defesa dos seus interesses nacionais". Entendo essa frase de duas maneiras. Numa, mais técnica, vejo que o editorial se compraz com o novo imperialismo chinês, que exporta tudo - até mão de obra - faz dumping no mercado, intervém diretamente no câmbio, etc. Noutra, mais galhofeira, entendo que o editorial pode resvalar para elogio implícito de a China manter a rédea curta em relação à Coréia do Norte e o Tibete sob tutela, enquanto o Brasil não faz o mesmo em relação ao Paraguai e a Bolívia.
Essa postura retrógrada e retroativa, além de anacrônica, vem da posição de querer, ainda, impor uma derrota a Lula, nem que seja post-facto, em relação às eleições de 2002, 2006 e 2010 (em que Dilma ganhou). Já que a frente social não dá margem mais a críticas de peso, a econômica está sub judice com a crise mundial, o estremecimento do euro e a desvalorização forçada do dólar, resta para essa visão cujo alcance é digno de uma ameba "provar" a absoluta inadequação da política externa de Lula e seus colaboradores aos interesses brasileiros - quer dizer - aos interesses das visões oligárquicas que querem balizar nossa diplomacia e lastrear nossas políticas de estado.
A derrota de Lula seria a de ter escolhido como sucessora alguém que está rompendo com ele e redirecionando o Brasil para voltar a seu "leito natural" - o de "permanent fellowship" com os Estados Unidos.
Nem mesmo a Alemanha, que quase sempre se pautou pelo apoio irrestrito às políticas norte-americanas desde os tempos de Konrad Adenauer, segue mais esta via. Isso, aliás, tem levantado muitas críticas ao ministro de Relações Exteriores alemão Guido Westervelle por parte dos que, aqui como aí, pensam que a política nacional do país deve se alinhar automaticamente com os interesses norte-americanos. Apesar da Alemanha ter enviado tropas para o Afeganistão (sob o governo social-democrata e verde), esse alinhamento não existe mais, pelo menos do mesmo modo. Além do caso da Líbia, dou outro exemplo significativo: quando ainda os EUA se calavam sobre a questão dos direitos humanos no Egito, Westerwelle foi um dos únicos chanceleres a questionar o então presidente Hosni Mubarak a esse respeito.
Mas para o mundo onde vivem os arautos do sonho oligárquico regressivo isso não existe. Nesse mundo, tudo continua como dantes no quartel... quero dizer, no curral do Abrantes. Se o povo consagrou Lula e Dilma, e a continuidade (óbvia, só não vê quem não quer) entre ambos, inclusive na política externa - com a evolução e a flexibilidade que esse "admirável mundo novo" requer, "derroguemos o povo". Na "nossa" eleição (a do pensamento oligárquico), ele perdeu, e perderá para sempre. Pelo menos até o "nosso" último suspiro (o dessa vocação oligáquica) que, esperemos (agora, nós, os "terceiro mundistas, juvenis e ingênuos"), não esteja muito longe, embora saibamos que, parodiando o ditado, "coisa ruim se revira até no túmulo".
Flávio Aguiar é correspondente internacional da Carta Maior em Berlim.
Walter -- EngaJarte-blog
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