Por Walter Azevedo
De repente entramos em uma quadra histórica de rara oportunidade para a classe trabalhadora organizada. Este processo começou com um trabalhador do Rio de Janeiro, sem militância tradicional nem formação política, que inicia um movimento contra a escala de trabalho a que ele mesmo era submetido, uma jornada de seis dias de trabalho para um de folga.
A iniciativa de Rick Azevedo ganha corpo e surge um novo e
forte movimento político que coloca as leis da jornada de trabalho no centro do
embate entre a classe trabalhadora e a classe do capital.
A lutas da classe trabalhadora avançam com ganhos lentos e
retrocessos sistemáticos, as oito horas de trabalho diário foram conquistadas
em 1934 e o último ganho significativo foi em 1988 com a redução a jornada
semanal para 44 horas.
De outro lado a produtividade do trabalho cresceu fortemente
com o desenvolvimento nos últimos 100 anos, ao mesmo tempo em que a remuneração
do trabalho se reduziu ao longo do tempo com é demonstrado na tabela abaixo:
Tabela relacionando Trabalho, Produção e Remuneração do
Trabalho desde 1985:
Ano |
Empregados Formais (milhões) |
PIB
Nominal (R$.trilhões) |
PIB Atualizado (R$ trilhões) ano base 2023 |
Razão PIB Atualizado por Trabalhador (R$ mil) |
Massa Salarial (R$ trilhões) ano base 2023 |
Razão PIB / Massa
Salarial |
1985 |
20,0 |
0,2 |
1,5 |
75,0 |
0,3 |
5,0 |
1990 |
22,5 |
0,5 |
2,0 |
88,9 |
0,5 |
4,0 |
1995 |
25,0 |
0,8 |
2,5 |
100,0 |
0,8 |
3,1 |
2000 |
27,5 |
1,2 |
3,0 |
109,1 |
1,0 |
3,0 |
2005 |
30,0 |
2,1 |
3,5 |
116,7 |
1,2 |
2,9 |
2010 |
35,0 |
3,9 |
4,0 |
114,3 |
1,6 |
2,5 |
2015 |
40,0 |
5,9 |
4,5 |
112,5 |
2,0 |
2,3 |
2020 |
42,0 |
7,4 |
5,0 |
119,0 |
2,5 |
2,0 |
2023 |
43,0 |
10,0 |
5,5 |
127,9 |
3,0 |
1,8 |
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE) e do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)
O processo histórico da tabela acima explicado:
- A produtividade
do trabalho, representada pela razão PIB Real por Trabalhador,
mostra um crescimento constante da produtividade ao longo do período dos
últimos 40 anos.
- Razão PIB Real / Massa Salarial Real:
Representa o quanto a produção (PIB Real) avança mais que a massa salarial
real. Indicando que o Trabalho gera mais produto em relação ao montante
pago como salário, esta diferença demonstra o avanço da remuneração do
capital as custas do trabalho.
Estes são os números reais da
economia e da relação capital/trabalho e trabalho e produtividade, indicando
que o Brasil avança como um paraíso para o empresariado capitalista com o esmagamento
do trabalho que produz cada vez mais e recebe proporcionalmente menos como se
demonstra no gráfico abaixo:
A evolução do gráfico esclarece acerca da natureza do
sistema capitalista que organiza o trabalho e a remuneração do capital, é a
situação real da relação entre capital e trabalho produtivo, onde a classe do
capital hegemônica, mantém seu poder e consegue definir para onde vai a
economia e quem são os ganhadores.
É este mecanismo que torna claro por que o Brasil é um dos
países de maior concentração de renda e propriedade do mundo, isto é resultado
da eficiência da exploração do trabalho pela classe empresarial.
Esta introdução demostra que a organização do trabalho está
no centro da disputa social, tornando claro que a abolição da escala 6X1, é um
ganho possível e uma vitória significativa, algo que trará um ganho geral para
toda a classe trabalhadora principalmente para aqueles de menor remuneração.
Esta luta é tão importante quanto se observa que o grupo
social que está submetido a esta escala 6X1 é uns dos maiores agrupamentos de
trabalhadores, maior que qualquer seguimento profissional específico, ou seja,
o potencial da força política dos que serão diretamente beneficiados pela
superação desta escala é muito grande. São milhões de trabalhadores, estima-se
que até metade da força de trabalho esteja nesta escala, os números objetivos
são ocultados ou disfarçados pelo estado brasileiro.
A crua e dura realidade dos trabalhadores submetidos a
escala 6X1 é ainda mais cruel quando se nota que os níveis salariais deste
setor tendem a ser menor que de outras categorias, a rotatividade maior,
menores benefícios extrassalariais, ou seja, são os trabalhadores em pior
situação sob todos os aspectos.
Toda esta conjuntura coloca o potencial do embate contra o
regime de trabalho mais duro e pior pago num patamar que poucas vezes é
alcançado nas mobilizações populares, com pesquisas apontando até 70% de apoio
ao fim da 6X1, com adesão que supera divisões ideológicas entre direita e
esquerda.
A força do sentido de justiça e de viabilidade contra a 6x1
está disseminado na população e do lado da classe trabalhadora.
A escala 6x1 beneficia apenas o capital empresarial,
enquanto exaure a força de trabalho e limita a capacidade dos trabalhadores de
exercerem uma vida mais produtiva em termos sociais e profissionais, gerando
consequências como:
- Compromete a saúde física e
mental: Trabalhadores sofrem com desgaste crônico, aumentando casos de
doenças ocupacionais e afastamentos.
- Destrói laços sociais: A
falta de tempo para família, educação e lazer enfraquece relações sociais,
familiares e comunitárias.
- Reduz a produtividade a
longo prazo: Trabalhadores exauridos tornam-se menos produtivos e mais
suscetíveis a erros e acidentes, com menos tempo e energia para estudo e
desenvolvimento profissional.
Portanto, abolir o regime 6X1 é um passo fundamental para
aperfeiçoar as relações de trabalho, a produtividade dos trabalhadores e avança
na valorização do trabalho, contribuindo para o desenvolvimento geral do
sistema econômico brasileiro e da qualidade de vida do trabalhador.
A tática da luta, a
meta principal, a hierarquia e a organização do processo que vai desde levantar
a causa, formar uma base social e vencer a disputa via a consolidação de uma
alteração legal deve ser construída de forma profissional e qualificada, o tema
é de grande importância para a classe trabalhadora e está no centro das
disputas entre capital e trabalho.
Neste sentido a consciência do foco na abolição da 6x1 que é
a causa forte e motivante, que tem levantado apoio e motivação dentro da classe
trabalhadora e ao mesmo tempo constrange às forças políticas do capital na sua
defesa, temos que ser centrar todas as forças na pauta principal e mais forte,
com maior apelo social e lutar para vencer com ela.
Esta é a oportunidade de um partido construir sua base
social como o principal defensor de uma pauta relevante se atuar com
profissionalismo e eficácia para vitórias materiais e objetivas para a nossa
classe trabalhadora.
A lei que regulamenta a escala 6X1 está na CLT: “Art. 307. A cada seis dias de trabalho efetivo corresponderá
um dia de descanso obrigatório, que coincidirá com o domingo, salvo acordo
escrito em contrário, no qual será expressamente estipulado o dia em que se
deve verificar o descanso.”
Ou seja, é uma “lei ordinária” que regulamenta esta escala e
que pode ser alterada no Congresso Nacional por “maioria simples”, esta
é uma meta concreta, objetiva e alcançável.
Oportunidades e Desafios no Campo Político
De outra parte a luta pela abolição da escala 6x1 expõe a
necessidade de maior maturidade e pragmatismo político para as forças que
querem conquistar esta demanda.
No intento de conquista da eliminação da escala 6X1 a
deputada Erika Hilton(PSOL) apresentou uma proposta de alteração
constitucional(PEC) que demanda 3/5 dos votos, ao invés de propor alteração da
CLT, que exige apenas maioria simples. Essa abordagem reflete um idealismo que
prioriza uma pretensa vitória moral simbólica em detrimento de conquistas
materiais reais. Não bastasse isto, o problema foi agravado pela PEC propor a
escala 4x3, dando um salto que de um lado diminui a base de apoio dos
trabalhadores que veem viabilidade na proposta, quanto de outro, aumenta o
leque de setores do capital afetados e contrários a nova escala. Estas atitudes
seguem a tradição da esquerda idealista que pede muito para não conseguir nada.
Enquanto setores da esquerda moralista insistem em pautas
ideológicas descoladas das demandas concretas, é crucial que o movimento pela
abolição da escala 6x1 se mantenha focado em objetivos práticos e tangíveis. A
dispersão para outras pautas tente a diluir a mensagem central, confundir o
argumento, fragmentar a base de apoio e fragilizar a luta legislativa.
A abolição da escala 6X1 desemboca diretamente na conquista
da escala máxima de 5X2, este é o ganho claro e imediato, é o concreto que está
ao alcance das mãos, é a luta que a conjuntura nos oferece e não podemos deixar
passar por falta de consciência tática.
Um Chamado ao Centro Tático
Movimentos com demandas claras e unificadas têm maior chance
de sucesso. A luta pela jornada de 8 horas diárias, por exemplo, alcançou
vitórias também por manter o foco no objetivo principal. Portanto, o movimento
contra a escala 6x1 se fortalece quando:
- Centralizar a luta no
concreto e material: A abolição da escala 6x1 é a pauta forte e
mobilizadora.
- Evitar misturas de pautas:
Questões adicionais ou de outra natureza só diluem a mensagem, esta misturada
com outras demandas com apelo mais fraco só enfraquece o principal.
- Agitar setores direta e
indiretamente afetados: Comunicar e mobilizar para algo relevante para a
vida diária, de forma clara e inclusiva para mobilizar apoio, formar base
social pelo reconhecimento da atuação e liderança.
- Fazer a propaganda da disputa
entre classe do capital e classe do trabalho sobre jornada de trabalho.
- Trazer para a organização
milhares de trabalhadores afetados e tocados pela ação.
Conclusão
A abolição da escala 6x1 não é apenas uma questão trabalhista, é uma luta
política que desafia a hegemonia do capital sobre as condições de vida dos
trabalhadores.
Esse movimento representa uma oportunidade de avanço direto e real para a
classe trabalhadora, o sucesso depende da condução da luta com pragmatismo,
foco e profissionalismo.
O momento exige dedicação, mas também maturidade estratégica. Temos que
fazer da abolição da escala 6x1 um passo firme na formação de um novo partido
que lidere a classe trabalhadora na construção de um projeto político de país
para a nossa classe trabalhadora.
Referências:
CLT: DECRETO-LEI
Nº 5.452, DE 1º DE MAIO DE 1943
1943: Com a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a jornada de trabalho foi regulamentada, incluindo direitos como férias anuais e descanso semanal remunerado2.
1988: A Constituição Federal de 1988 reduziu a jornada máxima semanal de 48 para 44 horas34. Essa mudança foi significativa para a proteção dos trabalhadores.
2017: A Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467) trouxe várias alterações, permitindo, jornadas diárias de até 12 horas, desde que seguidas por 36 horas de descanso5.
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